sábado, 21 de novembro de 2009

Candidatos em três tempos

Defendi por muitos anos minha posição contra o voto obrigatório, o voto de favor, o voto de amigo, o voto vendido, o votar por votar. Costumava não votar e pagar a multa. E tinha sempre minha justificativa.

Comparecer e votar em branco era algo impensável. Meio covarde. Por que fazer isso só para não pagar a multa? E que tal não comparecer e justificar? Seria mentira. O que diria? Estava viajando? Doente? Ah!, entraria na cabine e anularia o voto. Isso me parecia infantil. Afinal, o que mais eu sabia fazer era votar e votar bem. Ou não votar. Dessa forma, votar errado era o que menos combinava comigo. O fato é que eu não queria votar nos rebotalhos que se apresentavam como candidatos. Por que escolher um ou outro, se todos eram ruins?

Passei a não votar, pura e simplesmente. Depois, pagava a multa.

Aos amigos que, bem intencionadamente, questionam o “não voto”, com pagamento da multa e o cumprimento da minha pena, sempre respondo que não estou pregando a abstenção. Convido-os, quase sempre, a pensar. Se houve candidato idôneo, de sua preferência e capaz de representá-los no Congresso, elejam-no.

Contudo, será bom para quem quiser escolher o seu candidato nestes tempos particularmente descaracterizados pelo poder econômico, pelos oportunistas de sempre, anotar estas dicas, em três tempos.

PRIMEIRO TEMPO: PASSADO

O candidato tem, como nós todos, um passado. É necessário, absolutamente necessário, que ele seja conhecido. Um homem desconhecido, a não ser naquelas cidades do faroeste, é sempre um risco. Assim, ao ver um candidato, procure pelo seu passado. Logicamente, não vá procurar um santo. A origem da palavra candidato lembra aquele alguém de branco, representando pureza, apresentando-se como apto a viabilizar os interesses de seu povo. Nessa posição, ele apresentava o seu passado, seu presente e seu futuro, recebendo a unção dos seus pares ou a reprovação degradante, capaz de liquidá-lo para sempre.

Há dois tipos de candidatos, quanto ao passado. Aqueles que não foram eleitos ainda para nenhum cargo eletivo e estão estreando. Esses só têm o passado pessoal para apresentar.

Ou foram, até hoje, professores, médicos, advogados, líderes comunitários, comerciantes, ou, ainda, em outras vezes, são aquelas pessoas simples, boas, embora desconhecidas do grande público, sempre se relacionam com este ou aquele pequeno grupo e, depois de uma avaliação de suas possibilidades, vão a campo em busca do voto.

Os primeiros levam, aparentemente, desvantagem ou vantagem sobre os outros, conforme maior ou menor número de realizações, boas e más, que tenham feito.

Isso porque, quanto menos conhecidos, menos notórios também são os feitos do passado que venham a comprometer a candidatura ou sofrer análise do eleitor.

Já aqueles que foram vereadores, governadores, senadores, deputados, têm obrigação de apresentar um passado. Por terem sido homens populares, homens chamados públicos na linguagem comum, seu passado será necessariamente conhecido, para o bem e para o mal.

Todavia, você pensa que é fácil escolher entre esses homens de vida conhecida e notória? Não é. Posso dizer que é muito difícil.

Há aquele médico, com quarenta anos que pede na televisão para ser “o representante dos médicos”.

E no entanto, o que fez nesses últimos quarenta anos? Quais as suas realizações? Quais as suas obras? Qual foi a sua marca pessoal nesse tão longo tempo de "homem público"? O que ganhou com isso? O que perdeu?

Um deputado carioca, por exemplo, há vinte e cinco anos deputando (!) continua a disputar sua cadeira de parlamentar. Sua justificativa: “já nem sei fazer outra coisa".

Não obstante, além de seu computador que manda cartões de Natal por listagem telefônica para o Rio de Janeiro e para o mundo, o que fez ele como deputado? Quais são as suas obras? Com tanto tempo de casa, já foi situação, oposição e murista. E, no entanto...

Aquele outro vetusto senador, encanecido, trafegou todos os mapas do mundo como membro de uma comissão de relações exteriores do Congresso. E, contudo, suas realizações, suas obras, os benefícios que trouxe ao seu povo...

É o passado.

Seria, a esses candidatos, já com experiência de mandato, fácil trazer provas de seu trabalho e mostrá-las na TV, nos jornais ou em impressos pois sabemos que o que não falta a esses senhores é celulose farta e gratuita. Gratuita para eles, já que nós pagamos a conta.

Mas, embora saibamos que tudo isso, o trabalho e o passado desses canditatos não são absolutamente desconhecidos. Um projeto aqui, um projeto ali.

Uns ficam, da noite para o dia, conhecidos. Seja como Dante de Oliveira, que em um único projeto não realizado acabou indo para o Ministério Sarney e depois acabou governador do seu Estado por dois mandatos. Seja como aquele famoso parlamentar músico flagrado, com outros, faça-se justiça, tocando o nobre instrumento... do painel eletrônico.

Outros, ainda, brilhantes como ex-prefeitos, razoavelmente bem sucedidos, foram para o Parlamento com indiscutível volume de votos e... sumiram em meio ao dia-a-dia do “estafante mister de representante do povo”, como me afirmou um deles, com ironia, e, sem saber, acertando em cheio quanto ao que eu pensava sobre ele.

O passado escamoteado. O passado, negro ou branco, cândido ou diabólico, sempre sonegado ao eleitor. Quando é bom é demagogia revelá-lo. Imodéstia, no mínimo. Se o passado é mau, mostrá-lo à população é revanchismo, baixar o nível da campanha...

O fato é que o passado pode levar à glória ou à desgraça um candidato que já tenha estado na ribalta.

A reeleição só deve ser deferida pelo eleitor quando o passado é de trabalho, de realização, de respeito para com a dignidade do eleitor. Recebido um mandato eletivo, não cumprido, deve ir o ilustre pleiteante descansar o merecido repouso dos guerreiros ou dos bandidos.

Sobretudo, já que “política é sacrifício pessoal”, não se deve permitir que um pobre político, coitado, seja depauperado em suas economias e energias para obter um cansativo mandato, muitas vezes “incompreendido”.

Veja, pois, o passado. Todo candidato deve ter um passado. Já os que pretendem continuar na política, devem ter, obrigatoriamente, um bom passado. A vida ensinou, com sabedoria, que passado bom nunca é escondido.

SEGUNDO TEMPO: PRESENTE

Parece bem mais simples saber-se o presente de um candidato, não é? Bem, vejamos se, realmente, é. O que faz o candidato no presente? Como é ele entre os seus? Como age na comunidade? Como é na sua profissão, entre seus colegas, entre seus amigos?

O presente, quando bem administrado, bem vivido pode até redimir um passado de equívocos, de erros, embora em relação a candidatos nem sempre o passado seja perdoado. O presente costuma ser cruel, também, quando o povo se lembra do nosso passado.

Para alguns políticos, o presente compromete e, quando isso ocorre, o futuro tende a ficar manchado irremediavelmente.

Grandes combatentes de ontem, contra o crime, confraternizam-se com seus inimigos, hoje amigos circunstanciais. O palanque é terreno neutro, onde bandeiras brancas são acenadas para unir grandes adversários, que por sua vez fazem acordos inconfessáveis em nome dessa união e, infelizmente, sempre contra o povo.

Corruptos e corruptores se abraçam ao som ao hino pátrio. Cassados e cassadores dão-se beijos de Judas. Grandes paladinos opositores do contrabando e contra o jogo clandestino, eleitos no passado na esteira desse combate que parecia sério, acenam alegremente, dos palanques, suas limpas mãos de Pilatos.

E Pilatos, diante desses candidatos de hoje, tinha uma vantagem: benefício da dúvida. A História registra como seus crimes a omissão, a omissão, a dúvida, o medo ou simplesmente a indiferença pela sorte do Nazareno.

Já os nossos bravos representantes manusearam, apreciaram, degustaram, fotocopiaram, esconderam ou incineraram grossos volumes de denúncias, levantamentos, Comissões Parlamentares de Inquérito e outras provas que lhes aniquilaram os privilégios que a Pilatos foram conferidos.

Se você conhece um candidato e pode conciliar seu passado com seu presente, especialmente nestas eleições, onde os exemplos do que aqui mostramos são patentes e fartos, muito bem. Faça sua análise. Se não puder, pelo menos procure saber o que ele faz agora, no presente.

Quase todos os parlamentares que adentram sua casa, por exemplo, alguns até sérios e tidos como honrados, estão ganhando seus vencimentos e subsídios sem trabalhar na função parlamentar para a qual foram eleitos. Não há um, sequer, que seja inocente desse pecado. Esse é o seu presente.

TERCEIRO TEMPO: FUTURO

Aqui não tem perdão. Há só duas situações: ou o candidato promete, promete, diz que vai fazer isto ou aquilo. É o estilo comum, o candidato típico. Ou diz o que ele não vai fazer, aquilo que “os outros estão fazendo”, “a corrupção que aí está”, “a bandalheira”...

É sempre futuro. Poderíamos utilizar o célebre “diga-me com quem andas”, mas seria inútil. Afinal, quem está hoje ao lado dos velhos corruptos ou de notórios contraventores, pode não lhes seguir o caminho. Pode, contudo, tanto afastar-se deles como tomar-lhes o lugar.

Há, no entanto, um dado que nos permite entrever o futuro de grande parte dos candidatos. Como estão gastando o que não têm, o que não podem gastar e não poderão, por conseqüência, despender, estão obviamente, “investindo no futuro”, como disse, convicto, um vereador que pretendia chegar à Assembléia Legislativa.

E qual é esse futuro?

Devendo a vida e a eternidade a grupos, políticos maiores e grandes financiadores, tudo farão, certamente, para pagar a dívida com votos e outros compromissos. Isso se forem bons pagadores. Se forem maus, nada pagarão aos seus financiadores, como, aliás, nenhum deles costuma pagar ao povo as promessas que fazem do palanque.

C´est la vie.

3 comentários:

Unknown disse...

Muito bom, gostei. O que acho é que não podemos conhecer a vida dos candidatos por vários motivos.

Unknown disse...

Como sempre João você disse tudo e mais um pouco.

Joyce Hillary disse...

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